Tradicional
conta histórias que nem Deus duvida
O mundo da imaginação
A luz da lua
cheia, os ventos cortando a floresta com silvos curtos como vozes do além, os
bancos de madeira feitos de pedaços de pau, resto da queimada da roça, e
dezenas d e pessoas, sentados em roda, ouvem, quase sem piscar, os contos e as
histórias de um homem que é respeitado e parece ter o dom do conhecimento muito
mais do que a vida terrena permite.
Assim era o
final de dia e inicio de noite nas comunidades espalhadas pelos barrancos onde
moradores sobrevivem à luta do dia a dia, e tem, na força da imaginação, a
capacidade de recriar sonhos de todos os dias, mesmo que seja pela crendice
propagada por profetas de plantão.
Apenas
pescadores, agricultores, carregadores ou extrativistas que praticamente moram
na mata fechada, os homens tornam-se sábios e, se não tem cultura, tiram da
fantasia que cada um possui, as mais fantásticas histórias que alguém pode
imaginar.
Serão estes
mestres que a Ciranda Tradicional vai registrar neste Festival, retirando da
cultura popular, os “contos” que relatavam, à luz da lua, para seus familiares
e amigos, criando lendas e mitos que se perpetuaram e que atualmente são respeitados
e admirados, como se vida verdadeira tivessem e como se fosse possível
transformar a imaginação em realidade.
A Ciranda
Tradicional fez uma comparação do filosofo Arquimedes, da literatura grega, que
era o grande sábio que ficou como referencia e consulta, com o Arquimedes de
Paratari, o homem que fazia da ilusão, o relato de verdades do interior,
gerando as lendas que se eternizaram e que passam a ser a essência da cultura
popular, igual a dezenas de outros “mestres”, de tantas e tantas outras comunidades,
investidores de “causos” e, ao mesmo tempo, filósofos de uma terra chamada
Amazônia que não existe outra igual no mundo.
“Meninos, eu
vi”. Esta frase é definitiva para dar cunho de verdade a qualquer história de
final de dia, ate porque a lua não aceita mentiras que não sejam sinceras, logo
ela que é a patrocinadora do amor e das promessas de namorados e namoradas que
nem sempre cumprem o que prometem, mas que, naquele momento de ternura e de
conquista, só falam a verdade e nada mais do que a verdade.
Para a
Ciranda Tradicional, que foi buscar a histórias destes “Mestres da Cultura
Popular”, como são conhecidos, há um cabedal incrível de temas a serem
explorados, proporcionando a criatividade dos artistas nos seus galpões,
versáteis como eles só, e muito mais agora com a riqueza que o tema permite.
Há que
lembrar os “causos” como a lenda do corta água, o chute certeiro na porta do
céu, o duelo das águas, (a Iara, o Bacurau e a Sucuri), a mangueira do breu e
as curicas, o sarapó e a canoa voadora, o jandiá e a poranga, o raio que o
parta, a febre que fura rede e queimava canarana, a samaueira e o barco que
fazia cura, entre tantos e tantos outros, que ninguém é capaz de duvidas,
porque os contadores sempre alertam, para meninos e meninas, homens e mulheres,
que, “quem não acredita se visitado pelos entes puxando o dedão do pé ou
metendo o dedo no nariz”.
“A riqueza da nossa cultura é imensurável e
o que faz a Ciranda o centro da pesquisa da vida do homem é a capacidade da
imaginação, ingrediente único que dá o dom da superação na realidade e ainda
ilustra o mundo de cada um, do jeito que cada um deseja” explicou o eterno da
Tradicional, com sua forma alegre de falar e com o gestual que parece, a um só
tempo, o contador de história, fantasiado de cirandeiro de primeira grandeza.
25 de
agosto, Arquimedes o filósofo popular
contador de estórias das terras de manacá
Rebuscando a
vida, muito além do que os olhos podem ver, recriando a fantasia acima da
sabedoria dos mestres da literatura grega, a Ciranda Tradicional terá na ginga
do seu bailado e no canto do seu enredo, o desfilar de contos verdadeiros que
só a ilusão pode conceber e a fantasia pode aceitar, na imaginação de gerações
que ainda buscam sua verdadeira identidade.
A Tradicional
não quer só o passado como figuração, mas lições para o futuro, que nascem da
concepção no presente, da realidade que tem a sensação infinita com o
anoitecer, mas renasce com a força nos raios de sol, mostrando que a vida
continua, do jeito que ela é.
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